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Reflexões sobre a vida e o cotidiano. Aqui se encontra de tudo! Arte, poesia,banalidades, críticas e tudo o que faz parte da vida, inclusive o nada...

Fazer hoje o possível de hoje para amanhã fazer o impossível de hoje: Paulo Freire

Toda vida que preciso falar das idéias de Paulo Freire escuto das pessoas perguntas como: como sermos conscientes, como lutarmos por um mundo melhor, se nesse mundo para conquistarmos as coisas precisamos ser egoistas?
E me dá aquela sensação de que os pensamentos competitivos, de que apenas poucos podem "vencer" a vida e coisa e tal são tão arraigados na mente e nas atitudes das pessoas que imagino se um dia será possível estipar essas ervas daninhas da boa convivência.
Lembro de um colega com quem já tive severas discussões a esse respeito que simplesmente me diz: "Que culpa tenho eu de ter alcançado o sucesso" Para ele não interessa mais nada a sua volta a não ser o seu sucesso. O pior é que ele não compreende que o mundo a sua volta também faz parte de sua vida.
Ao chegar em casa após esse curso de capacitação, liguei a Tv e assisti um documentário sobre as grandes pandemias que assolaram e poderão assolar o mundo. Nele o foco era a gripe aviária e as preocupaçoes com as mutações dos vírus. Mostravam que o vírus da gripe H5N1 (gripe aviária) era uma mutação do vírus da gripe de 1918 e que os pesquisadores desenvolveram uma vacina com medo das inúmeras mortes que as próximas mutaçoes dos vírus poderiam trazer. Entretanto, sua maior preocupaçao é a falta de verba para produzi-la e distribui-la no mundo, pois para as industrias farmacêuticas esse não é um negócio rentável. Vacinação nunca é uma boa oportunidade de negócio, o melhor é investir em remédios para doenças crônicas. Desta forma, os países desenvolvidos poderiam até bancar a vacinação de seus povos, mas quem iria se responsabilizar pela vacinação dos povos da África e América LAtina? Assim questionava um membro da Organização Mundial de Saúde.Poderiam os países desenvolvidos sobreviver isolados dos países em desenvolvimento? De onde iriam ser retirados os recursos naturais, a mão de obra barata e outras formas de exploração? As barreiras de contato humano entre estes Países seria suficiente para proteger o mundo inteiro de uma pandemia? E como o mundo poderia funcionar dessa forma?E será que deveria funcionar assim?

Pronto essa foi a melhor analogia que poderá explicar o porque eu não posso me preocupar com o meu próprio sucesso sem levar em conta o mundo a minha volta. E infelizmente é por essa lógica que não conseguimos perceber que uma grande pandemia já assola o mundo todos os dias: fome , desesperança,violência, droga... Precisamos uns dos outros...Essa é a verdade.Posso ter uma casa, um carro, um emprego,comida e vacinação, mas preciso me relacionar como o mundo a minha volta, preciso das pessoas, preciso andar nas ruas, preciso que todas as crianças tenham alimentação e segurança, preciso não colocar a minha própria vida em risco com o aumento da violência, preciso de um mundo sem drogas , pois existem cada vez mais pessoas excluídas e sem esperança que precisam utiliza-la. Preciso de um mundo minimamente justo para que jovens de classe média e alta não precisem dar sentido às suas vidas incendiando índios, roubando carros, brigando em festas e usando drogas.... Pensamento egoísta esse, né? Mas essas são coisas que só eu preciso? Ou são coisas que se todos tivessem um pouquinho tudo ao redor poderia ser melhor? E se o bolo fosse melhor repartido?
Em tempos de eleição: Vote consciente! Faça a diferença

Há uns anos, já formada, ao ler alguns autores como Martin Baró, Paulo Freire, Cezar Wagner e Maritza Monteiro fui realmente tocada por questões existenciais que mudaram minha vida. Pensar para que serve um psicólogo me fez olhar diferente para a minha própria profissão, mas isso é um tema para outro post, o que importa é que depois disso, entrei para um projeto de extensão da Universidade Federal do Ceará-UFC o NUCOM e nele me deparei com pessoas incríveis, com uma enorme profundidade teórica e o melhor de tudo com o compromisso social de aplicar o que liam. Deixo aqui um vídeo da atuação deles e divido a sensação reconfortante de perceber que existem jovens que lutam, que se engajam e ainda são amorosos. São um exemplo para mim e fico com a dívida de me envolver mais ainda em causas como essas. Aqui vai a minha homenagem.


Saber carregar seu fardo, não significa que não pode questiona-lo.

Em posts anteriores e como principal objetivo deste blog, venho procurando trazer reflexões sobre a vida, comportamentos, sobre as pessoas e claro expressar minhas opiniões  e os valores que procuro aplicar em minha vida. Muitas dessas reflexões servem mais para mim do que para outras pessoas, mas como costumo ouvir de alguns que ler meu blog promove uma auto-reflexão e um sentimento agradável acabo ficando bastante feliz com isso. Alguns posts atrás fui pega de surpresa por uma colega extremamente afetada com o que lia aqui por acreditar que minha proposta seria definir um caminho para a felicidade como a verdade e a vida e que isso soa extremamente arrogante.
Longe de mim tal objetivo. Esse é o caminho que eu escolhi para mim e para quem quiser vir comigo.Tenho minhas limitações,defeitos e problemas como qualquer ser humano.
Só acho que  trabalhar compulsivamente,criticar compulsivamente,pensar compulsivamente,lucrar compulsivamente,comer compulsivamente,qualquer outro comportamento que  afete negativamente  a mente, o corpo e os relacionamentos são caminhos que eu procuro, nem sempre consigo, não seguir.
Na verdade acredito que pensar sobre formas de superar todas essas coisas é uma desafio prazeroso que gosto de ter.

Acho que as pessoas tem suas dificuldades, limitações e suas escolhas.
Só acho que saber carregar seu fardo não significa que não pode questiona-lo ou pelo menos encontrar outra forma de levá-lo. Isso para mim seria uma burrice existencial.

Encontrar caminhos de uma existência mais feliz é o meu propósito e abrir esse espaço para discutir sobre eles é maravilhoso. Esse é o meu caminho, qual o seu?

bjo bjo

O corpo e suas lições de vida

Adoro  crianças e ao observar as suas necessidades fico sempre refletindo porque ao chegarmos na idade adulta acabamos perdendo o respeito por necessidades que nos são básicas: 
Hora de comer, hora de dormir (isso equilibra o metabolismo e evita irritações)
Hora de brincar, hora de criar...(isso promove sanidade mental e desenvolve o cérebro)
Respeitar seus limites, (sua autoestima agradece)
Ter companhias agradáveis nos faz manter um coração cheio de amor. 
Uma criança amada e bem cuidada é na maior parte do tempo sorridente e amorosa . Para isso ela ainda precisa de sorte e nós adultos porque nao cultivamos relaçoes interpessoais saudáveis ao invés de sermos  egoistas ou competitivos? (o mundo agradece essa iniciativa)
Acontece que enquanto adultos nossas necessidades básicas ficam  abafadas por outros desejos  (carreira, estética,sucesso, relacionamentos amorosos, status...) e muitas vezes esquecemos de cuidar  do que é simples e básico , cuidar do nosso lado instintivo,do nosso corpo que sente sono, fome, que precisa sorrir . 
São por essas razões que as vezes somos pegos  por reações muitas vezes avassaladoras e não consiguimos explicar. Por que agimos de uma forma agressiva, de onde vem aquele choro incontrolável, uma insõnia, uma angustia, um ataque cardíaco, uma sindrome do pânico, uma doença insistente...Ás vezes seu organismo vem dando sinal de que nao está bem e você é que não consegue perceber... Assim como a febre é um sinal de alerta, o psiquismo também tem seus mecanismos de expressar suas situações limites. Nós é que precisamos aprender a ler seus sinais...
Preste atenção no funcionamento do seu intestino, no ritmo de sua respiração,no que você come,faça um check-up esporadicamente,observe a causa daquela tristeza que vai e passa , assim você aprenderá a identificar os sinais do que não faz da sua vida algo saudável e os hábitos ou relacionamentos que precisam ser ajustados. 

Nosso corpo e nosso psiquismo são como uma máquina  que sempre precisa de manutenção, de bons combustiveis e de ajustes de vez enquando.

bjo bjo



Para completar trouxe um texto antigo que vi no orkut de minha amiga e que serve de lição para uma vida adulta mais madura e plena.

 "Tudo que hoje preciso saber - sobre como viver, o que fazer e como ser - aprendi no jardim-de-infância.

        A sabedoria não se encontrava no topo da montanha da pós-graduação, mas no montinho de areia da escola.
        Estas são as coisas que lá aprendi:
        - Compartilhar tudo.
        - Jogar dentro das regras.
        - Não bater nos outros.
        - Colocar as coisas de volta onde pegou.
        - Arrumar a bagunça.
        - Não pegar as coisas dos outros.
        - Pedir desculpas quando machucar alguém.
        - Lavar as mãos antes de comer.
        - Dar a descarga.
        "Biscoitos quentinhos e leite frio fazem bem para você".
        Para levar uma vida equilibrada - "aprenda um pouco, pense, desenhe, pinte, cante, dance, brinque e trabalhe um pouco todos os dias".
        Quando sair, cuidado com os carros: dar as mãos e ficar juntos.
        Reparar nas maravilhas da vida: "Lembre-se da sementinha no copinho plástico: as raízes descem, a planta sobe e ninguém realmente sabe como ou porque, mas somos todos assim".
        O peixinho dourado, o hamster, os camundongos brancos e até mesmo a sementinha no copinho plástico - todos morrem. Nós também.
      "Tudo o que você necessitar saber, está lá, em algum lugar. A Regra de Ouro é o amor e a higiene básica".


        Pegue qualquer desses itens, coloque-o em termos mais adultos e sofisticados e aplique-o à sua vida familiar, ao seu trabalho, ao seu governo ou ao seu mundo e verá como ele é verdadeiro, claro e firme.
       Pense como o mundo seria melhor se todos nós - no mundo todo - tivéssemos biscoitos com leite todos os dias por volta das 3 da tarde e pudéssemos nos deitar com um cobertorzinho para uma soneca.
       Ou se todos os governos tivessem como regra básica devolver todas as coisas ao lugar em que as encontraram e arrumassem a bagunça que fazem.
       E é sempre verdade, não importando a idade: ao sair para o mundo, é sempre melhor dar as mãos e ficar juntos.
      
Autor desconhecido

Sobre formaturas e outros rituais ..

Em minha festa de formatura,  estava junto com alguns jovens de uma outra geração, atrasei o curso e por isso me formei com pessoas que não eram da minha turma e por isso deparei-me com valores  bem diferentes dos meus.
A começar com a música de entrada, eu queria entrar com uma música cantada pela Maria Bethânia, pois além de adorar a cantora, achava que a música escolhida definia minha vida e a mim mesma. Entretanto, tive que combater as sérias críticas pois a idéia do cerimonialista e da própria turma era que todos entrassem com músicas animadas: tecnos ,funks e etc. Nada contra, mas eu definitivamente queria consagrar aquele momento, o fim de um  ciclo, com uma música que tivesse a minha cara. A música acabou sendo cortada pelo cerimonial, entrei apenas com um trecho dela, mas pude sentir e experiencia-la de uma forma autêntica.
Essa foi uma experiência em que aprendi o quanto os rituais em nossa sociedade estão sendo banalizados e graças a ela pude transformar o meu casamento em um momento de extremo significado para mim, para meu marido e para nossa família. Os mais queridos e íntimos foram para a areia da praia assistir o pôr-do-sol e o nascer da lua e desejar os mais sinceros sentimentos para o inicio de uma nova vida. Aredito nos rituais (quinze anos,formaturas,casamentos), acho que eles são bonitos e necessários, mas acredito neles como um momento de significado social e ajustes psicológicos diante as novas etapas da vida, por isso muito além da pompa e do luxo o que precisamos dar conta é do que realmente é importante para nós ou  tudo será resumido na quantia de dinheiro que foi gasta e as lembranças que ficam e que carregamos por toda vida, nem sempre serão agradáveis. Uma lembrança maravilhosa nem mastercard compra.

Segue abaixo a o vídeo da minha entrada em minha formatura ele ainda me define como ninguém. bjobjo


 

Bazar em prol do consumo consciente!

Eu vou estar lá! Vamos?

Sobre escolas e gaiolas

"Há escolas que são gaiolas e há escolas que são asas.

Escolas que são gaiolas existem para que os pássaros desaprendam a arte do vôo. Pássaros engaiolados são pássaros sob controle. Engaiolados, o seu dono pode levá-los para onde quiser. Pássaros engaiolados sempre têm um dono. Deixaram de ser pássaros. Porque a essência dos pássaros é o vôo.Escolas que são asas não amam pássaros engaiolados. O que elas amam são pássaros em vôo. Existem para dar aos pássaros coragem para voar. Ensinar o vôo, isso elas não podem fazer, porque o vôo já nasce dentro dos pássaros. O vôo não pode ser ensinado. Só pode ser encorajado."

*Rubem Alves

Adoro esse texto!!!  Procuro guardá-lo no meu coração para quando for mãe, para mim e minha vida. Em um post passado escrevi sobre quadrados e bordas e não sei se consegui me expressar devidamente, mas o que almejava, era refletir sobre essa questão. O que queria escrever é que existem pessoas e ambientes que nos aprisionam, nos impedem de pensar, procuram nos engaiolar,nos fechar em quadrados e eu quero ser alguém que encoraja vôos, quero fazer isso profissionalmente e em qualquer papel que exerça na vida. (mãe,amiga,esposa, filha e etc). 
Acho bonito e necessário aquelas pessoas que nos dão uma "real",sei até aquelas que fazem muito bem esse papel na minha vida, mas o fato é que se elas permanecem no lugar onde estão( e eu as valorizo por isso) é porque elas querem que eu faça o meu vôo consciente. Entretanto, elas nunca, nunca, desencorajaram o meu vôo, pelo contrario, me incentivam a fazê-lo.
Eu escolhi isso para minha vida, voar, sonhar, pensar, não sou pássaro de gaiolas, gosto da liberdade dos vôos e gosto também de encorajar as pessoas ao meu redor a voar...não gosto de lugares e nem pessoas-gaiolas.
Eu nasci para voar e ajudar os outros encontrarem suas essências.
Por isso tenho amigos de todas as idades, raças, orientaçoes sexuais, cores, religiões, posição social.
Se eles são meus amigos é porque sabem respeitar a minha essência e vice-versa.
Acho inclusive que escolhi trabalhar com psicologia e com educação porque penso que a condição para ser feliz é entender sua essência, ajustar as asas e permanecer num constante vôo tranquilo, sem prisões e nem pressa.
Espero saber passar isso para meus filhos.
Isso é o que tenho de mais precioso para ensina-los.

bjo bjo

O que são burros motivados?

Recebi por email uma entrevista que retrata um dialógo que tivemos no almoço de ontem, com um casal de amigos. Falávamos daquilo que chamam de sucesso e das metas que precisamos alcançar para sermos reconhecidos como um "vencedor". Um amigo Thiago e o meu marido, questionavam a real felicidade das pessoas que conquistaram poder e dinheiro e observavam que a maioria delas eram extremamente  infelizes, pois denotavam não saber o que de fato eram seus objetivos de vida, muitas vezes não tinham tempo para gastar o dinheiro que ganhavam e com frequência lamentavam da vida... reclamam de suas rotinas corridas, do cansaço, de seus subordinados incompetentes...dos impostos...
O irônico é que para a maioria das outras pessoas esse é o tipo de vida invejável: carro, beleza, dinheiro, jóias e como sempre quem as tem "mantêm a pose" de pessoas felizes, esse aspecto é sempre reforçado socialmente. Pelos que tem sucesso e pelos que não tem.
A revista Vida Simples desse mês também questiona o perfecionismo que nos é imposto e que nos aprisiona e nos impede de ser feliz..Lá tem um relato de uma psicóloga que atende alguns pacientes e dentre eles um que é jovem, bonito, tem sucesso, uma carrerira invejável e uma bela esposa,entretanto, não consegue transar com ela.. tão afogado com suas autocobranças e medo do fracasso.

Até quando vamos aceitar essa lógica doentia em que vivemos e somos impedidos de sermos humanos,limitados, mas saudáveis?

Segue abaixo o link com a reportagem da Vida Simples

http://vidasimples.abril.com.br/edicoes/095/grandes_temas/mania-perfeccionismo-578428.shtml

Segue abaixo a entrevista de Camilo Vannuchi com Roberto Shinyashiki, médico psiquiatra, com Pós-Graduação em administração de empresas pela USP, consultor organizacional e conferencista de renome nacional e internacional:

"CUIDADO COM OS BURROS MOTIVADOS"

Em "Heróis de Verdade", o escritor combate a supervalorização das aparências, diz que falta ao Brasil competência, e não auto-estima.
ISTOÉ -- Quem são os heróis de verdade?

Roberto Shinyashiki -- Nossa sociedade ensina que, para ser uma pessoa de sucesso, você precisa ser diretor de uma multinacional, ter carro importado, viajar de primeira classe. O mundo define que poucas pessoas deram certo. Isso é uma loucura. Para cada diretor de empresa, há milhares de funcionários que não chegaram a ser gerentes. E essas pessoas são tratadas como uma multidão de fracassados. Quando olha para a própria vida, a maioria se convence de que não valeu a pena porque não conseguiu ter o carro nem a casa maravilhosa. Para mim, é importante que o filho da moça que trabalha na minha casa possa se orgulhar da mãe. O mundo precisa de pessoas mais simples e transparentes. Heróis de verdade são aqueles que trabalham para realizar seus projetos de vida, e não para impressionar os outros. São pessoas que sabem pedir desculpas e admitir que erraram.

ISTOÉ -- O sr. citaria exemplos?

Shinyashiki -- Quando eu nasci, minha mãe era empregada doméstica e meu pai, órfão aos sete anos,empregado em uma farmácia. Morávamos em um bairro miserável em São Vicente (SP) chamado Vila Margarida. Eles são meus heróis. Conseguiram criar seus quatro filhos, que hoje estão bem. Acho lindo quando o Cafu põe uma camisa em que está escrito "100% Jardim Irene". É pena que a maior parte das pessoas esconda suas raízes. O resultado é um mundo vítima da depressão, doença que acomete hoje 10% da população americana. Em países como Japão, Suécia e Noruega, há mais suicídio do que homicídio. Por que tanta gente se mata? Parte da culpa está na depressão das aparências, que acomete a mulher que, embora não ame mais o marido,mantém o casamento, ou o homem que passa décadas em um emprego que não o faz se sentir realizado, mas o faz se sentir seguro.

ISTOÉ -- Qual o resultado disso?

Shinyashiki -- Paranóia e depressão cada vez mais precoces. O pai quer preparar o filho para o futuro e mete o menino em aulas de inglês, informática e mandarim. Aos nove ou dez anos a depressão aparece. A única coisa que prepara uma criança para o futuro é ela poder ser criança. Com a desculpa de prepará-los para o futuro, os malucos dos pais estão roubando a infância dos filhos. Essas crianças serão adultos inseguros e terão discursos hipócritas. Aliás, a hipocrisia já predomina no mundo corporativo.

ISTOÉ - Por quê?

Shinyashiki -- O mundo corporativo virou um mundo de faz-de-conta, a começar pelo processo de recrutamento. É contratado o sujeito com mais marketing pessoal. As corporações valorizam mais a auto-estima do que a competência. Sou presidente da Editora Gente e entrevistei uma moça que respondia todas as minhas perguntas com uma ou duas palavras. Disse que ela não parecia demonstrar interesse. Ela me respondeu estar muito interessada, mas, como falava pouco, pediu que eu pesasse o desempenho dela, e não a conversa. Até porque ela era candidata a um emprego na contabilidade, e não de relações públicas. Contratei-a na hora. Num processo clássico de seleção, ela não passaria da primeira etapa.

ISTOÉ -- Há um script estabelecido?

Shinyashiki -- Sim. Quer ver uma pergunta estúpida feita por um Presidente de multinacional no programa O aprendiz? "Qual é seu defeito?" Todos respondem que o defeito é não pensar na vida pessoal: "Eu mergulho de cabeça na empresa. Preciso aprender a relaxar". É exatamente o que o Chefe quer escutar. Por que você acha que nunca alguém respondeu ser organizado ou esquecido? É contratado quem é bom em conversar, em fingir. Da mesma forma, na maioria das vezes, são promovidos aqueles que fazem o jogo do poder. O vice-presidente de uma as maiores empresas do planeta me disse: "Sabe, Roberto, ninguém chega à vice-presidência sem mentir". Isso significa que quem fala a verdade não chega a diretor?

ISTOÉ -- Temos um modelo de gestão que premia pessoas mal preparadas?

Shinyashiki -- Ele cria pessoas arrogantes, que não têm a humildade de se preparar, que não têm capacidade de ler um livro até o fim e não se preocupam com o conhecimento. Muitas equipes precisam de motivação, mas o maior problema no Brasil é competência. Cuidado com os burros motivados.

Há muita gente motivada fazendo besteira. Não adianta você assumir uma função para a qual não está preparado. Fui cirurgião e me orgulho de nunca um paciente ter morrido na minha mão. Mas tenho a humildade de reconhecer que isso nunca aconteceu graças a meus chefes, que foram sábios em não me dar um caso para o qual eu não estava preparado. Hoje, o garoto sai da faculdade achando que sabe fazer uma neurocirurgia. O Brasil se tornou incompetente e não acordou para isso.

ISTOÉ -- Está sobrando auto-estima?

Shinyashiki -- Falta às pessoas a verdadeira auto-estima. Se eu preciso que os outros digam que sou o melhor, minha auto-estima está baixa. Antes, o ter conseguia substituir o ser. O cara mal-educado dava uma gorjeta alta para conquistar o respeito do garçom. Hoje, como as pessoas não conseguem nem ser nem ter, o objetivo de vida se tornou parecer. As pessoas parecem que sabem, parece que fazem, parece que acreditam. E poucos são humildes para confessar que não sabem.

ISTOÉ -- Por que nos deixamos levar por essa necessidade de sermos perfeitos em tudo e de valorizar a aparência?

Shinyashiki -- Isso vem do vazio que sentimos. A gente continua valorizando os heróis. Quem vai salvar o Brasil? O presidente. Quem vai salvar o time? O técnico. Quem vai salvar meu casamento? O terapeuta. O problema é que eles não vão salvar nada! Tive um professor de filosofia que dizia: "Quando você quiser entender a essência do ser humano, imagine a rainha Elizabeth com uma crise de diarréia durante um jantar no Palácio de Buckingham". Pode parecer incrível, mas a rainha Elizabeth também tem diarréia. Ela certamente já teve dor de dente, já chorou de tristeza, já fez coisas que não deram certo. A gente tem de parar de procurar super-heróis. Porque se o super-herói não segura a onda, todo mundo o considera um fracassado.

ISTOÉ -- O conceito muda quando a expectativa não se comprova?

Shinyashiki -- Exatamente. A gente não é super-herói nem superfracassado.A gente acerta, erra, tem dias de alegria e dias de tristeza. Não há nada de errado nisso.

ISTOÉ -- Muitas pessoas acham que é fácil para o Roberto Shinyashiki dizer essas coisas, já que ele é bem-sucedido. O senhor tem defeitos?

Shinyashiki -- Tenho minhas angústias e inseguranças. Mas aceitá-las faz minha vida fluir mais facilmente. Há várias coisas que eu queria e não consegui. Jogar na Seleção Brasileira, tocar nos Beatles (risos). Meu filho mais velho nasceu com uma doença cerebral e hoje tem 25 anos. Com uma criança especial, eu aprendi que ou eu a amo do jeito que ela é ou vou massacrá-la o resto da vida para ser o filho que eu gostaria que fosse.

Quando olho para trás, vejo que 60% das coisas que fiz deram certo. O resto foram apostas e erros. Dia desses apostei na edição de um livro que não deu certo. Um amigão me perguntou: "Quem decidiu publicar esse livro?" Eu respondi que tinha sido eu. O erro foi meu. Não preciso mentir.


ISTOÉ - Como as pessoas podem se livrar dessa tirania da aparência?

Shinyashiki -- O primeiro passo é pensar nas coisas que fazem as pessoas cederem a essa tirania e tentar evitá-las. São três fraquezas. A primeira é precisar de aplauso, a segunda é precisar se sentir amada e a terceira é buscar segurança. Os Beatles foram recusados por gravadoras e nem por isso desistiram. Hoje, o erro das escolas de música é definir o estilo do aluno. Elas ensinam a tocar como o Steve Vai, o B. B. King ou o Keith Richards. Os MBAs têm o mesmo problema: ensinam os alunos a serem covers do Bill Gates. O que as escolas deveriam fazer é ajudar o aluno a desenvolver suas próprias potencialidades.


ISTOÉ -- Muitas pessoas têm buscado sonhos que não são seus?

Shinyashiki -- A sociedade quer definir o que é certo. São quatro loucuras da sociedade. A primeira é instituir que todos têm de ter sucesso, como se ele não tivesse significados individuais. A segunda loucura é: Você tem de estar feliz todos os dias. A terceira é: Você tem que comprar tudo o que puder. O resultado é esse consumismo absurdo. Por fim, a quarta loucura: Você tem de fazer as coisas do jeito certo. Jeito certo não existe. Não há um caminho único para se fazer as coisas. As metas são interessantes para o sucesso, mas não para a felicidade.


Felicidade não é uma meta, mas um estado de espírito. Tem gente que diz que não será feliz enquanto não casar, enquanto outros se dizem infelizes justamente por causa do casamento. Você pode ser feliz tomando sorvete, ficando em casa com a família ou com amigos verdadeiros, levando os filhos para brincar ou indo a praia ou ao cinema. Quando era recém-formado em São Paulo, trabalhei em um hospital de pacientes terminais. Todos os dias morriam nove ou dez pacientes. Eu sempre procurei conversar com eles na hora da morte. A maior parte pega o médico pela camisa e diz: "Doutor, não me deixe morrer. Eu me sacrifiquei a vida inteira, agora eu quero aproveitá-la e ser feliz". Eu sentia uma dor enorme por não poder fazer nada. Ali eu aprendi que a felicidade é feita de coisas pequenas. Ninguém na hora da morte diz se arrepender por não ter aplicado o dinheiro em imóveis ou ações, mas sim de ter esperado muito tempo ou perdido várias oportunidades para aproveitar a vida.